Conforme dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), em 2016 ocorreram mais 590 mil novos casos de câncer no País. Deste total, uma importante parcela necessitou de tratamento farmacológico, ou seja, utilizou hormônio ou quimioterapia, além de outros fármacos que podem ser usados para o tratamento paliativo, como anti-inflamatórios, glicocorticoides e até antidepressivos.
Diante da necessidade de tratamento farmacológico, tão necessário quanto a disponibilidade do medicamento é o acompanhamento farmacoterapêutico realizado pelo farmacêutico, segundo o professor do ICTQ de Atenção Farmacêutica em Oncologia, o farmacêutico e study coordinator do Hospital Haroldo Juaçaba – ICC, Nelson Belarmino. Dessa forma, é possível identificar mais precocemente os possíveis eventos adversos ou a necessidade de intervenção, como ajuste de doses, suspensão ou mesmo a escolha de outro fármaco para o tratamento dos pacientes - decisão essa que deve ser tomada juntamente com o médico.
O oncologista Ricardo Caponero, autor dos livros A Comunicação Médico-Paciente no Tratamento Oncológico (MG Editores), e Cuidados paliativos - Conversas sobre a vida e a morte na saúde (Ed. Manole), ressalta a importância do farmacêutico com relação às orientações sobre o uso de medicamentos oncológicos.
“Cada medicamento vai ter uma forma de conservação e administração. O importante é que o paciente receba do farmacêutico as informações de forma o mais específica possível. Algumas pessoas têm o hábito de esmagar comprimidos ou abrir as cápsulas. Isso nem sempre é adequado. Os profissionais devem informar a forma de tomar a medicação, se podem ser tomadas com alimentação ou se precisam de jejum, o que fazer em caso de esquecimento de uma dose etc.”, diz o médico. Ele afirma que são muitos detalhes e nem sempre o paciente lembra de todos. “Por isso, o reforço da informação, o detalhamento pelo farmacêutico e, se possível, o fornecimento de informações específicas por escrito para que o paciente possa consultar depois são fundamentais”, destaca ele.
Já Belarmino afirma que, durante a consulta de um paciente oncológico feita por um farmacêutico, seja em ambiente hospitalar ou na farmácia, um dos principais pontos a serem observados é a adesão ao tratamento, uma vez que a resposta está diretamente relacionada ao uso correto do medicamento. “Deve também ser considerada uma refratariedade da doença ao medicamento utilizado, o que é possível ser observado por meio de uma progressão clínica ou mesmo radiológica”, ressalta o farmacêutico.
Acompanhe, a seguir, todas as orientações de Belarmino sobre como fazer esse acompanhamento. Dessa forma, você, farmacêutico, poderá prestar um atendimento adequado aos seus pacientes.
Como fazer o acompanhamento de pacientes oncológicos na farmácia
1 – Certifique-se de que o paciente fez uma consulta com o médico inicialmente;
2 – Leve-o, durante a abordagem do paciente na farmácia, à área da clínica ou uma sala privativa. Se não houver, utilize um espaço um pouco mais reservado;
3 – Liste os medicamentos prescritos e os mantidos;
4 - Avalie as possibilidades de interações medicamentosas, uma vez que esses pacientes podem ser polimedicados;
5 – Oriente sobre a melhor forma de uso quanto ao horário de tomada, principalmente para os medicamentos de uso oral;
6 – Esclareça ao paciente sobre os eventos adversos possíveis de surgimento e inerentes ao medicamento em uso;
7 – Evidencie que a questão dos possíveis eventos adversos deve ser tratada com o farmacêutico, pois, em muitas situações, o paciente abandona o tratamento ou altera a posologia por conta própria, deixando de tomar alguma dose do dia. Lembre a ele que, em sua grande maioria, esses eventos já são esperados. Por isso, é fundamental manter um acompanhamento farmacoterapêutico com esse pacientes;
8 – Explique que podem surgir problemas inesperados. Em caso de algo novo ocorrer com o paciente, ele deve ser orientado a entrar em contato com o profissional de saúde que vem lhe acompanhando;
9 – Peça, neste caso, que ele retorne, já que é fundamental o farmacêutico estar inserido nesse processo, uma vez que acaba por ser o profissional de saúde que está na ponta da cadeia, e que, na grande maioria das vezes, recebe esses pacientes primeiramente;
10 – Esteja alinhado com o médico prescritor, pois assim terá condições de discutir sobre alguns achados relatados pelo paciente, para que possam tomar a melhor conduta, sempre com o foco na segurança do paciente.
9 Detalhes que fazem a diferença
1 - DURANTE A CONSULTA - Além da adesão ao tratamento, outro ponto importante a ser avaliado durante a consulta com pacientes oncológicos é a presença de eventos adversos que, em várias situações, podem ser limitantes para a continuidade do tratamento, como é o caso do cloridrato de irinotecano, quimioterápico antineoplásico utilizado para diversos tipos de tumores, como o carcinoma metastático do cólon ou reto não tratado previamente, o carcinoma metastático do cólon ou reto, a neoplasia pulmonar de células pequenas e não-pequenas, a neoplasia de colo de útero, a neoplasia de ovário, a neoplasia gástrica recorrente ou inoperável e o linfoma maligno.
O cloridrato de irinotecano é conhecido por um evento adverso marcante, a diarreia, que pode, em várias situações, chegar a atrasar o tratamento, além de suspender parcialmente ou mesmo definitivamente o seu uso. A diarreia ocasionada por esse fármaco é considerada um evento grave e pode levar o paciente à morte, caso não tratada a tempo.
2 - DIETA - Quanto à dieta para os pacientes oncológicos, é importante que seja avaliado caso a caso, pois se sabe que, dependendo do tipo do sítio primário, o paciente poderá ou não aderir a uma dieta normal, mas o importante é sempre trabalhar com uma equipe multiprofissional, uma vez que o nutricionista ficará responsável pela alimentação ideal de cada paciente.
3 - INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS – Mensurar as interações medicamentosas é algo que não se consegue em sua totalidade. Da mesma forma que em pacientes com outras patologias, os oncológicos também podem sofrer com as interações medicamentosas, principalmente quando utilizam drogas orais que, nos últimos anos, vem ganhando espaço no arsenal para o controle de diversos tipos de cânceres. Esse é o caso da capecitabina, uma droga oral que in vivo é convertida para a fração citotóxica 5-fluorouracil (5-FU). A formação de 5-FU é catalisada preferencialmente no tumor por um fator angiogênico associado ao tumor, denominado timidina fosforilase, minimizando assim a exposição dos tecidos sadios do organismo ao 5-FU sistêmico.
Tomando por base a capecitabina, as interações observadas com seu uso são as alterações nos parâmetros de coagulação, aumento na concentração de fenitoína quando utilizada concomitantemente a capecitabina, dentre outros. O importante é saber que todos os fármacos estão sujeitos a sofrer interação, sejam entre fármacos ou entre alimentos. É fundamental compreender o fato e não deixar essa interação agir de forma negativa ao tratamento.
4 - PRINCIPAIS DESAFIOS – Atualmente, os principais desafios para um acompanhamento farmacoterapêutico quanto à adesão ao tratamento é garantir com que a dose prescrita seja a dose utilizada pelo paciente. Diferentemente dos quimioterápicos antineoplásicos injetáveis, são utilizadas drogas orais, os pacientes conseguem fazer um manejo dos eventos adversos mais facilmente e por conta própria. Basta apenas deixar de tomar a dose subsequente do dia ou mesmo suspender a dose para que logo aquele evento regrida, na maioria das vezes, de um grau elevado para grau zero.
5 - COMPLICAÇÕES DA FALTA DE ACOMPANHAMENTO - Dentre as complicações observadas pela falta de acompanhamento farmacoterapêutico pode-se dizer que, sem sombra de dúvidas, a mais importante é a não adesão ao tratamento. No entanto, outra complicação igualmente grave é a possibilidade de uma toxicidade relevante, que pode levar a problemas com a saúde do paciente, ou mesmo levá-lo a óbito.
6 - RESULTADOS - O sucesso do acompanhamento farmacoterapêutico se dá quando há um paciente tratado, com o mínimo de reações adversas e uma adesão ao tratamento de pelo menos 85% que, por sua vez, é esperado uma melhor resposta. Claro que isso dependerá de outros fatores como a genética do paciente, assim como a refratariedade ao tratamento utilizado.
7 - DOCUMENTAÇÃO - Assim como outras atividades realizadas com os pacientes oncológicos, o acompanhamento farmacoterapêutico deverá gerar dados, ou seja, deverá ser documentada, uma vez que todos esses dados poderão ser utilizados por vários outros profissionais, sejam médicos, enfermeiros, nutricionistas etc. Em ambiente hospitalar ou em clínicas em que o paciente é avaliado por profissionais de diversas áreas, essa atitude garante a segurança do paciente por meio do registro. Logo, a documentação do acompanhamento farmacoterapêutico é imprescindível.
8 - AUXÍLIO AO MÉDICO - O profissional farmacêutico vem, nos últimos anos, contribuindo de forma direta com a conduta médica, principalmente em instituições que já têm a atividade de farmácia clínica. Isso permite melhor assistência ao paciente, antes exercida apenas pelo profissional médico. Para alguns, o farmacêutico continua sendo o profissional que fica limitado apenas à dispensação de medicamentos. Para outros, inclusive para os médicos, ele já é um aliado para as importantes tomadas de decisão, ou seja, o farmacêutico - quando qualificado - é um aliado dos diversos membros de uma equipe de saúde multiprofissional.
9 - REGULAMENTAÇÃO DA ATIVIDADE - Importante salientar que os farmacêuticos estão regulamentados perante o Conselho Federal de Farmácia (CFF), de acordo com Resolução 623 de 29/04/2016, que estabelece a necessidade de titulação mínima para a atuação do farmacêutico na oncologia. Atualmente, o cenário no País ainda mostra que há uma real necessidade de mais farmacêuticos com experiência nessa área, não só para a manipulação de quimioterápicos antineoplásicos, mas também para uma melhor atenção farmacêutica para os pacientes oncológicos. Dessa forma, eles podem receber um acompanhamento farmacoterapêutico de qualidade e seguro, afinal, essa atividade é imprescindível, uma vez que na grande maioria das vezes é aplicada em pacientes polimedicados.
Fonte: ICTQ
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